Segundo umha embaçada lembrança lisboeta, foi lendo um livro a caminho
do trabalho, num comboio da linha Santa Apolónia-Castanheira do
Ribatejo, que fiquei sabendo da fama de desconfiado e indeciso do povo
mineiro.
Na hora, achei bem engraçada essa coincidência galego-mineira de sermos considerados povos receosos e hesitantes.
Pouco depois, recordo-me que sorri quando descobrim num Pingo Doce,
popular supermercado português, que a couve mineira era conhecida em
Portugal como couve galega. Também me lembrei de que tanto a culinária mineira quanto a galega eram muito conceituadas e apreciadas.
Quando aprendim que Minas Gerais (MG) era um território rural, com umha populaçom muito espalhada, que tinha proporcionalmente o maior número
de municípios do país, com umha importante massa florestal de
monocultura de eucalipto e era o principal produtor de leite do Brasil
nom pudem deixar de continuar a fazer comparaçons.
A seguir, alguém me falou da política do café com leite. Assim batizada porque durante a República Velha, quer dizer, a 1ª República no Brasil,
o poder era revezado entre a oligarquia paulista, produtora de café, e
a mineira, produtora de leite. Um vasto número de presidentes
brasileiros até hoje fôrom mineiros: Afonso Pena, Venceslau Brás,
Delfim Moreira, Arthur Bernardes, Juscelino Kubitschek ou a última
presidenta legítima do Brasil, Dilma Rouseff, vítima de um recente
golpe de Estado.
Tentei fazer mais umha associaçom e cismei naquilo que diziam de que a
guerra civil espanhola fora cousa de dous galegos, um da Corunha,
Casares Quiroga, -melhor Queiroga- presidente da República, e outro de
Ferrol, Francisco Franco, militar golpista. Pensei em Portela Valadares
e mesmo no atual presidente do governo espanhol, Mariano Rajoi. Até
reparei num dado curioso, os dous principais partidos da Espanha, o
PSOE e o Partido Popular, tinham sido fundados por galegos, Pablo
Iglésias e Manuel Fraga. Eis o nosso particular café com leite.
Minas Gerais é também viçoso celeiro literário. Clássicos da literatura brasileira Guimarães Rosa, Drummond de Andrade, Darcy Ribeiro mas
também contemporáneos, Rubem Fonseca, Ciro dos Anjos, Luiz Ruffato,
Marcos Bagno tenhem em MG o seu berço. Martim Codax, Rosália de Castro, Curros Henriques, Pardo Bazán, Valle Inclám, Cunqueiro, Manuel Rivas ou
Suso de Toro, som alguns dos principais escritores da literatura galego-portuguesa, galega e espanhola nascidos na Galiza. A Galiza é,
aliás, dos poucos povos da península que tem um Prémio Nobel de
literatura, Camilo José Cela. Catalisador da riqueza literária de ambos
os povos, o multifacetado intelectual Paz Andrade escreveu A galecidade
na obra de Guimarães Rosa.
Mas as semelhanças nom ficavam por aqui. Assim que ouvim "arreda um
pouquim" acabei por me convencer da necessidade de escrever este
artigo.
Em Minas som corriqueiros os usos do verbo arredar, tam do gosto dos
nossos galeguistas arredistas, e do sufixo -im no lugar de -inho,
típico das falas do leste da Galiza, muito próximo para mim, cuja
estirpe materna é do lugar de Lamas no concelho de Baralha, comarca dos Ancares. Ainda tivem tempo de ouvir com freqüência "vou ir" para
surpresa de puristas que confundem língua portuguesa com língua-padrom.
Por último, nom queria deixar de chamar a atençom de o melhor
cartunista galego, Miguelanxo Prado, ter dedicado um livro à capital de
Minas Gerais, Belo Horizonte, nem esquecer que um dos melhores
fotógrafos do mundo, o mineiro Sebastião Salgado, fotografou as
mariscadoras das rias galegas no seu álbum Trabalhadores.
Artigo originalmente publicado no Diário Liberdade
About Latest Posts Francisco Manuel Paradelo RodriguesFrancisco Manuel
Paradelo Rodrigues, "Xico" Nasceu em Ourense (1966).
Autor e dinamizador de banda desenhada, iniciou o seu trabalho neste
âmbito com o reconhecido coletivo Frente Comixário em 1989. Desde
aquela participou na organização das Xornadas de Banda Deseñada de
Ourense ou no I Encontro de Debuxantes Galegos entre outras
iniciativas.
Fundador da publicação BD Banda, é também um dos autores da guia
didática e mais das exposições As bases da banda, e As Cantigas de
Santa Maria, arte BDieval, que compilam propostas didáticas arredor da
banda desenhada. Militante da cultura e ativista também do humor
gráfico, é um dos fundadores do colectivo PESTINHO, autores da História
da Língua em Banda Desenhada, em colaboração com o Grupo
Reintegracionista Meendinho. Tem colaborado em diferentes publicações
de humor e BD, tais como XO, O Pasquim, ou Retranca. Também foi e é
membro de diferentes movimentos sociais e culturais, como A Gente da
Barreira ou a Coordenadora Galega de Roteiros, sendo um dos fundadores
do Movimento Defesa da Língua, da Academia Galega da Língua Portuguesa
e do Partido da Terra. Trabalha como professor de ensino primário num
centro do rural de Ourense. Latest posts by Francisco Manuel Paradelo Rodrigues (see all) Enquanto houver força… - 28 de Outubro de
2016
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da Língua - PGL.gal.
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Eduardo
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